segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Paris, Texas



ALEMANHA / FRANÇA
PARIS, TEXAS
1984
WIM WENDERS
HARRY DEAN STANTON
DEAN STOCKWELL
NASTASSJA KINSKI
SINOPSE:



Um homem (Harry Dean Stanton) é encontrado exausto e sem memória, em um deserto ao sul dos EUA. Aos poucos ele vai se recordando de sua vida, sendo acolhido pelo irmão Walt (Dean Stockwell), que é casado com Anne (Aurore Clément). Com eles vive também Alex (Hunter Carson), filho do homem sem memória, que aos poucos volta a se identificar com o pai.



SOBRE

Poucos filmes conseguem unir duas escolas tão distintas de cinema – a norte-americana e a européia – como “Paris, Texas” (Alemanha/EUA, 1984), o filme comercialmente mais bem sucedido do cineasta alemão Wim Wenders. Aliás, esse trabalho é provavelmente, dentre todas as obras da filmografia de Wenders, aquele que expõe de maneira mais evidente as paixões do diretor pela cultura dos EUA, pela Sétima Arte e por histórias intimistas a respeito da solidão, do silêncio e da incomunicabilidade. O filme, vencedor da Palma de Ouro em Cannes em 1984, faz esse cruzamento com habilidade e beleza.

“Paris, Texas” transpõe a temática favorita de Wim Wenders, a incomunicabilidade, para dois territórios que são visualmente ícones dos Estados Unidos: os desertos do Texas e a cidade caótica e pós-moderna de Los Angeles. O filme possui um enredo que soa como se uma das histórias delicadas do japonês Yasujiro Ozu, sobre as dificuldades de viver em família, fosse reescrita pelo italiano Michelangelo Antonioni e filmada nos Estados Unidos. Ao recriar esses temas sob sua própria visão de mundo, Wenders logra alcançar um resultado original, que culmina no final com uma tour-de-force visual belíssima, em uma das grandes cenas de diálogo do cinema contemporâneo.

O enredo gira em torno de Travis (Harry Dean Stanton). Quando o filme inicia, Travis caminha sob o sol inclemente do deserto texano, com um galão de água nas mãos e um boné de beisebol vermelho na cabeça. Ele entra em um bar e desmaia. A partir de seus documentos, os proprietários da birosca avisam ao irmão dele, Walt (Dean Stockwell). A notícia é recebida como um choque, pois Travis era dado como desaparecido há quatro anos. Após sofrer com o doloroso divórcio da mulher Jane (Natassja Kinski), Travis havia simplesmente sumido de casa, deixando com o irmão seu filho pequeno, Hunter (Hunter Carson). Walt, que mora em Los Angeles, viaja até o Texas para ir buscar Travis.

O andarilho é um personagem fascinante. Ele praticamente não fala e pouco lembra do passado. Não recorda bem do irmão e menos ainda do filho. É claramente um homem perturbado emocionalmente, um alcoólatra que abandonou a família – na verdade, desistiu de viver – e foi forçado a voltar ao lar. A câmera de Wim Wenders se dedica, a partir daí, a acompanhar a dolorosa e traumática readaptação de Travis à civilização, mostrando seus esforços para recuperar o sentido de família. Mudo, barba por fazer, olhos injetados como tivesse acabado de se recuperar de um porre, Harry Dean Stanton oferece uma interpretação magistral como Travis.

O pequeno Hunter é outro personagem a quem Wenders dedica atenção especial. Ele rejeita o pai mas, como qualquer criança magoada, logo encontra uma razão insignificante para explicar isso – o pai usa sapatos velhos demais. TRavis sabe que, evidentemente, ele se ressente por ter sido abandonado, e tem paciência para reconquistá-lo aos poucos, ajudado pela visão de alguns vídeos caseiros da família no passado. Mais uma vez, a câmera de Wender acompanha o processo de longe, sem pressa. Wender evita os closes, prefere deixar algum espaço entre seus personagens e a platéia. Assim, não invadimos por completo as intimidades de Travis e Hunter. “Paris, Texas” é lento e silencioso. Exprime, como poucas obras, a sensação de solidão.

O cineasta conta com duas colaborações inestimáveis. A primeira é a fotografia brilhante de Robby Müller, cheia de cores ricas e paisagens panorâmicas de tirar o fôlego, tanto no poeirento deserto quanto no concreto da cidade grande. Müller brilha especialmente na fantástica seqüência em que Travis reencontra Jane, dentro de uma sala de shows eróticos cheia de superfícies com vidros e espelhos. Ele está de um lado do vidro, no escuro, e pode vê-la; no lado oposto, uma bela Natassja Kinski vê apenas uma sombra. Robby Müller filma o longo diálogo entre os dois com perícia, evitando que reflexos atrapalhem o grande momento visual que é esse encontro.

A outra parceria está na música de Ry Cooder, uma das mais lindas trilhas sonoras já feitas nos Estados Unidos. Munido de um violão, o músico vai buscar nos velhos blues acústicos a inspiração para compor canções reflexivas, que exprimem em sons a solidão e a melancolia da vida de Travis. A paixão por blues, pelas imagens do deserto e pelos sons da cidade grande são características de um estrangeiro que ama a terra que o adotou. “Paris, Texas” não nega isso. E completando a obra, o roteiro brilhante de Sam Shepard conduz a trama rumo a um final surpreendente, capaz de fazer até um espectador experiente se derramar em lágrimas.


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